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À nossa volta
(...nem sempre a galinha do vizinho será a melhor...)
Falar ou escrever sobre oque se passa à nossa volta vem de longe. Já nos primórdios, o ser humano logoapós conquistar a posição erecta começou a preocupar-se com o que o rodeava.Inicialmente mais por necessidade única e inequívoca de sobrevivência edepois, por aprendizagem, numa tentativa de melhorar a sua qualidade de vida.
Ohábito enraizou-se e nos dias de hoje é comum o Homem vir a público (emassociação ou como mero freelancer) alertar, aprovar ou reprovar o quese faz à sua volta e mesmo apresentar sugestões para o que deveria ser feito.Para se fazer ouvir, embora nem sempre escutado, o chamado articulista usafrequentemente os jornais, mas convenhamos que nem sempre o faz em modoscorrectos e, pior ainda, por vezes o espírito crítico ultrapassa as raias daética e transforma-se em autêntica bisbilhotice. Não tem sido nossa prática,também não o será hoje e se a presente crónica entra um pouco em searaalheia é com um único propósito reflectivo.
O episódio que aqui vos trago é do domínio público e refere-se à lutaentre duas localidades nossas vizinhas. A questão prende-se com a criação (ounão) do concelho de Canas de Senhorim, vila e freguesia (ainda)pertencente ao município de Nelas e já fez correr muita tinta.
Os canenses apelam à emancipação. Apresentam como argumentos o possuíremcapacidade de desenvolvimento próprio, o ostracismo a que têm sido votados eas razões históricas de já terem sido concelho até mil oitocentos e tal.
Por seu turno, a sede-mãe,
nada interessada em perder a filha, contrapõe quea base histórica "não cola" e numa perspectiva algo extremista atéprevê que a divisão provoque a absorção do "minúsculo concelhode Nelas" pelos concelhos limítrofes.Da simples guerra de palavraspassou-se aos actos. As gentes de Canas associaram-se, formaram o MovimentoPro-Concelho e de luta em luta conseguiram que a Assembleia da Repúblicacriasse o Município de Canas de Senhorim. No entanto, a elevação não obteveo consenso unânime dos deputados presentes e para ser viável houve anecessidade do Parlamento criar, dois dias depois, uma Lei-quadro dos Municípiosonde encaixasse o caso de Canas. (dandoideia queo carro andou à frente dos bois)
Canasfestejou, mas anteviam-se problemas e aquela Lei-quadro foi vetadapelo Presidente da República. Este chumbo não constituiu surpresa, poiso mais alto dignitário da Nação já tinha declarado ser contra a criação demunicípios à la carte e que Portugal corria o risco de se transformarnuma trágica manta de retalhos, afinal o oposto recomendado pelomovimento europeu.
É certo que ainda neste mês de Setembro a lei irá regressar ao Parlamento e tambémé verdade que como não é lei orgânica bastará o voto da maioria dos deputadospresentes (note-se) para obrigar o PR a promulgá-la. À prioripoderá parecer um dado adquirido para as gentes de Canas, mas correm rumoresque alguns deputados (da maioria) são a favor de uma reflexão mais profunda docaso.
A guerra não é nossa. É um facto. De qualquer modo não me escuso a colocar dúvidasse o actual concelho de Nelas (muito semelhante ao nosso em superfície e populaçãoe com igual número de freguesias) terá potencial de desenvolvimento paraaguentar tal desintegração. E convenhamos que esta separação não émodelo algum, antes sim um verdadeiro contra-senso se atendermos que os municípioslutam por se associarem em busca de maior fortalecimento do Poder Local.
Em reflexão final, resta-me dizer que de modo algum invejo a galinha delesou doutros, que prefiro a minha tal como é que e que dou graças (mais uma vez)pela elevação da nossa terra a cidade. Quanto a mim, tal promoção é edeve ser vista também como forma de coesão entra as gentes, embora pense queserá necessária uma pequena mudança de atitude para todos nos considerarmoscidadãos da cidade de Santa Comba Dão.
(Redigido em Setembro 2003)
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